Advogados questionam projeto que altera Lei da Recuperação Judicial

Advogados questionam projeto que altera Lei da Recuperação Judicial

A Câmara dos Deputados aprovou o Projeto de lei 6.229/2005, com uma série de mudanças na Lei de Falências (Lei 11.101/2005), por conta da calamidade pública da epidemia de coronavírus. As maiores inovações são: as possibilidades de financiamento na fase de recuperação judicial, ampliação do parcelamento das dívidas tributárias federais e apresentação do plano de recuperação pelos credores. Segundo especialistas no assunto, o projeto aprovado pela Câmara tem uma série de pontos questionáveis. Agora, o Senado vai analisar o texto.

Para Domingos Fernando Refinetti, sócio da área de Recuperação Judicial do WZ Advogados, o projeto traz alterações profundas no atual regime de recuperação judicial.

Em análise preliminar, alguns pontos chamaram a atenção do advogado: o exercício da atividade rural passou a ser contemplado; a incidência do imposto sobre a renda e a contribuição social sobre o lucro líquido incidentes sobre o ganho de capital resultante da alienação de bens ou de direitos pela pessoa jurídica em recuperação judicial; a possibilidade de apresentação de plano de recuperação judicial pelos credores; a ampliação da natureza das obrigações que estarão livres de sucessão em caso de alienação de bens na recuperação judicial; a ordem de preferência de pagamento dos credores em caso de falência; a declaração da extinção das obrigações do falido (fresh start); a recuperação extrajudicial; as conciliações e mediações antecedentes ou incidentais aos processos de recuperação judicial; o financiamento do devedor e do grupo devedor durante a recuperação judicial (DIP loans); a insolvência transnacional; e o pagamento dos débitos para com a Fazenda Nacional pelo empresário ou sociedade empresária em recuperação judicial.

“São, todos tópicos relevantes e sobre os quais vale a pena que os operadores do direito se debrucem com atenção e afinco, com o intuito de levar ao Congresso Nacional contribuições que permitam aprimorar esse importante marco regulatório das atividades empresariais no Brasil”, afirma.

A advogada Simone Zaize de Oliveira, sócia da Keppler Advogados Associados, considera que o projeto pouco contribui para a recuperação das empresas. Segundo ela, a proposta “despreza os esforços de construção jurisprudencial dos últimos anos, cria problemas que não existiam, como na sistemática de alienação de unidade produtiva isolada, torna mais dificultosa a obtenção de novos recursos financeiros, impedindo a alienação de bens que não compõem o ativo circulante, dota o Fisco de um protagonismo desenfreado e não cuida de problemas antigos”.

Ela cita o exemplo do privilégio de que goza o crédito bancário e a falta de estímulo ao fomento de empresas em dificuldade, tornando inócuo, mais burocrático e pouco efetivo o sistema de proteção à empresa em dificuldade, mesmo que ela seja viável, contribuindo para a destruição do emprego e renda. Ela diz esperar que o projeto não prospere.

Atividade rural

O advogado Eduardo Diamantino, sócio do Diamantino Advogados, ressalta proposta “incluiu finalmente a possibilidade expressa do produtor rural requerer a sua recuperação judicial”.

De acordo com o projeto,  o produtor, para obter o benefício, deve comprovar que exerce atividade por no mínimo dois anos, por meio da apresentação da Escrituração Contábil Fiscal (ECF) — se pessoa jurídica —, pela apresentação de Livro Caixa Digital do Produtor Rural (LCDPR), ou documento similar. Ainda, dispõe sobre a possibilidade de o produtor rural optar pelo plano de recuperação especial similar ao destinado aos microempresários individuais, mas desde que o saldo devedor não ultrapasse o valor de R$ 4,8 milhões.

Para o advogado, contudo, nem tudo são flores. Isso porque, conforme explica, o mesmo projeto visa à alteração da Lei 8.929/94 quanto à não sujeição da Cédula de Produto Rural (CPR-Física) aos efeitos da recuperação judicial. “Na emissão da CPR-Física, o agricultor recebe dinheiro do investidor e garante pagar de volta com parte da safra. A medida pode fazer sentido para o agente financiador, mas pode gerar desconforto ao produtor, pois como cumprirá a obrigação em caso da perda de safra?”, indaga.

“A proposta até tenta trazer algum alento porque discorre que, em caso de força maior, é possível obter a  suspensão da obrigação, porém determina que caberá ao Ministério da Agricultura definir o que será hipótese de caso fortuito e de força maior. Isto é, a norma, tal como está, acaba gerando insegurança jurídica, porque, por mero ato administrativo (portaria), poderão ser alterados os critérios legais, o que não faz muito sentido, ainda mais quando esse órgão está sujeito a pressões políticas.  Melhor seria se a lei trouxesse rol com critérios objetivos e razoáveis, ainda que caráter exemplificativo”, explica.

Há ainda outros problemas. “O projeto discorre ainda que o crédito rural (Lei 4.829/65)  também não se sujeitará aos efeitos da medida. Esse fato torna a recuperação do pequeno produtor inviável, já que boa parcela dos recursos obtidos vem dessa forma de financiamento. Esperamos que no Senado tais questões sejam revistas porque, nos moldes atuais, a lei será para poucos”, conclui.

Revista Consultor Jurídico, 30 de agosto de 2020, 13h42

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