Precatório paulista entra na mira do CNJ

Precatório paulista entra na mira do CNJ

Corregedora Eliana Calmon vai comandar operação que investigará motivos do atraso no pagamento dos títulos devidos pela Prefeitura de São Paulo e pelo governo do estado, onde a dívida supera R$ 20 bi

Luciano Feltrin lfeltrin@brasileconomico.com.br

A novela dos precatórios—realidade que se arrasta em todas as instâncias do país — ganhará novos e decisivos capítulos em breve. Preocupado com o atraso no fluxo de pagamentos dos títulos, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) quer resolver o problema começando pelo maior devedor: o estado de São Paulo, cuja dívida com precatórios ultrapassa os R$ 20 bilhões.

Preocupado com os volumes bilionários de recursos encalhados, o CNJ apertou o cerco sobre o Tribunal de Justiça (TJ) do estado e começa hoje a monitorar de perto o assunto. Uma equipe do órgão inicia a semana se juntando aos funcionários do TJ para tentar entender os motivos que fazem com que alguns credores fiquem décadas para receber indenizações às quais têm direito legal.

“Queremos investigar se a fila de pagamentos não anda bem por questões operacionais ou se há má-fé em não querer liberar o dinheiro”, explicou a corregedora do CNJ, Eliana Calmon, na sexta-feira (2), após visitar a sede do TJ paulista para preparar o terreno para a tarefa de investigar como andas as análises dos processos de precatórios.

Para Eliana, tudo indica que as maiores dificuldades em acelerar os pagamentos estão concentradas em problemas de gestão. “A informática chegou muito atrasada ao Tribunal de Justiça de São Paulo. Mas serei a primeira a falar se encontrar problemas de outra natureza”, avisou a corregedora, que recentemente esteve envolvida com outra polêmica: a que levou as regras sobre até onde vai o poder de investigação do CNJ ao Supremo Tribunal Federal (STF).

Atrasos nos julgamentos

Quando questionado sobre a hipótese de que o atraso nos desembolsos dos precatórios seria intencional — há denúncias de que Tribunal estaria represando cerca de R$ 1 bilhão de recursos já liberados pela prefeitura de São Paulo para ganhar dinheiro com aplicações financeiras, o presidente do TJ, o desembargador Ivan Sartori, elevou o tom. “Desafio alguém a provar isso. Essa acusação faz parte da campanha que parte da mídia começou nos últimos meses para denegrir a imagem do Judiciário.”

Visivelmente irritado, Sartori explicou que os recursos depositados em juízo rendem um spread (retorno financeiro) médio de 0,20% no Banco do Brasil (BB), instituição financeira para onde vai a maior parte do dinheiro dos precatórios.

“Não há conflito de interesse ou tentativa de atrasar os pagamentos. Esse retorno é apenas uma das fontes de receita do fundo de investimento do Judiciário”, justificou. Esse tipo de remuneração é autorizado pelo CNJ. O conselho, aliás, se reunirá com bancos que recebem os recursos desses processos no próximo dia 14, uma quarta-feira, para, inclusive, negociar uma tentativa de ampliar o percentual dos atuais 0,20% para 0,30%. “São volumes altos de aplicação, que interessam aos bancos e parece justo discutir essa elevação de taxa”, afirmou Eliana Calmon, após a reunião no TJ paulista.

Sartori disse ainda que, no caso dos recursos dos precatórios, juros e correção monetária são creditados em favor do credor em contas específicas e não do Judiciário.

Pagamentos milionários

A chegada do grupo de trabalho do CNJ ao TJ também facilitará as investigações sobre as denúncias de irregularidades em pagamentos milionários feitos a magistrados aposentados.

Sartori reconheceu que há pelo menos dois casos desse tipo sendo analisados mais de perto, mas defendeu os colegas de Tribunal. “Não temos nada contra os pagamentos, que estão dentro da legalidade. Se os valores são altos, podem ser relativos aos direitos de quem se aposentou e recebeu dentro da legalidade. O que há de errado nisso?”, questiona.

A FILA QUE NÃO ANDA

– Os precatórios são títulos que representam dívida pública(União, estados, municípios e estatais)de processos vencidos na Justiça por alguém que tenha se considerado prejudicado por atos ou desapropriações do governo

– Tendo como maior devedor o estado de São Paulo, o país acumula cerca de R$ 84 bilhões em precatórios não liquidados

– Em alguns casos, os vencedores dessas ações têm demorado décadas para receber as indenizações a que têm direito

– Como os governos paulistas não têm feito a fila dos precatórios andar, o problema chegou ao Judiciário

– O Tribunal de Justiça de São Paulo está sendo acusado de não fazer esforços para que os títulos sejam liquidados. O motivo é que os bancos que recebem depósitos judiciais remuneram o tribunal pelo volume

Fonte: Brasil Econômico

Atrasos são um problema político

Maior parte dos precatórios paulistas é de indenizações trabalhistas ao funcionalismo

O acúmulo de dívidas originado pela lentidão no pagamento dos precatórios em São Paulo é um típico problema político. A opinião é do advogado Eduardo Diamantino, que integra a comissão de precatórios da seção paulista da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).

Com a questão sendo jogada para baixo do tapete há quase duas décadas e os recursos para saldar dívidas antigas dormindo nos cofres do governo, o problema acabou caindo no colo do Judiciário. Mas a solução terá de ser costurada politicamente, acredita o especialista. “Há uma mistura de fatores que explica a situação atual: governos que sanearam as contas do estado às custas de não pagar dívidas de décadas com precatórios, juízes que perderam a capacidade de se indignar e lutar por isso e um Tribunal que tecnologicamente está na era das cavernas”, ataca.

Embora sem citar números ou percentuais, o advogado diz que a maior parte dos precatórios em atraso envolve indenizações trabalhistas de funcionários públicos. Na lista estão ainda valores a serem desembolsados pela desapropriação de imóveis para construções em que o estado tenha de indenizar antigos proprietários—como terrenos na rota do metrô.

Soluções técnicas

Além do fator político, fundamental em seu entender para que o governo assuma o compromisso de liquidar anualmente percentuais mínimos com dívidas de precatórios, também é preciso dar ao Judiciário condições para que amplie receitas, sem depender da retenção de precatórios para se sustentar.

“No Rio de Janeiro, aconteceram as duas coisas, com a criação de uma taxa que destina 1% das custas judiciais aos cofres do Judiciário e o governo estabelecendo metas anuais para reduzir o estoque da dívida”, exemplifica.L.F.

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