Com dívida de R$ 11 bi, Estado sufoca municípios mineiros
Cidades não têm como pagar o funcionalismo por conta de atrasos de repasses da gestão Pimentel
Em Divisa Alegre, no Vale do Jequitinhonha, os professores não recebem salários desde outubro por causa dos atrasos nos repasses do governo do Estado. Eles representam 50% da folha salarial do município, e a situação já afeta as demais atividades econômicas, com redução drástica de vendas no comércio e uma perspectiva de fim de ano difícil para grande parte dos moradores. A realidade é a mesma para a maioria das cidades da região, por causa dos quase R$ 11 bilhões de dívidas do governo de Minas Gerais com as prefeituras, de acordo com cálculos da Associação Mineira de Municípios (AMM).
Se a falta desses recursos é o que faz os servidores municipais ficarem sem salários, a retenção dessa verba evitou que a situação do funcionalismo estadual estivesse ainda pior. Esse valor de R$ 11 bilhões representa o pagamento de mais de quatro folhas salariais mensais do Estado, que é de R$ 2,5 bilhões. Ele é o melhor exemplo da “metáfora do cobertor curto” que o governador Fernando Pimentel “puxou para cobrir o lado” que representava seus interesses.
O prefeito de Divisa Alegre, Marcelo Olegário (PRB), reclama que, além de não ter dinheiro para pagar os professores, também não terá com o pagar o 13º salário para os demais servidores e reclama da ausência de perspectivas “Os professores estão sofrendo, passando dificuldades. Isso afeta toda a economia da nossa cidade. Os armazéns não estão vendendo como antes, têm dificuldades para receber o que já foi vendido, e vai travando toda a economia. O pior é que a gente olha para essa situação, e estamos de mãos atadas, porque o problema não é com a gente, é com o Estado”, desabafou o prefeito.
A situação de Divisa Alegre se repete em 80% das cidades da região, de acordo com o presidente da União dos Municípios do Vale do Jequitinhonha e prefeito de Pontos dos Volantes, Leandro Santana (PSDB). “Essa é a realidade dos municípios mineiros. A maioria deles já não consegue pagar os salários dos professores. Na nossa cidade, estamos utilizando recursos próprios para manter o salário, mas são poucas as prefeitura que têm recursos em caixa para fazer o pagamento”, avalia.
Ele não acredita que haverá alguma mudança, com o pagamento dos repasses nesse fim de mandato. “Infelizmente, não há nada que esperar desse governo que ainda não sabe como irá pagar o 13º salários do funcionalismo estadual”, diz.
O governo de Minas afirma que está em busca de um acordo judicial com os municípios para o pagamento dos repasses em atraso. O governador eleito, Romeu Zema (Novo), por sua vez, já se encontrou com prefeitos de grandes cidades nesta semana para discutir o assunto. Ele destaca que é preciso tomar conhecimento do caixa do Estado para ver como solucionará o problema.
“Já estive reunido com vários grupos de prefeitos e prefeitas e expliquei que ainda não tivemos acesso ao fluxo de caixa do nosso Estado. A partir do momento em que assumirmos realmente o governo, em janeiro, é que teremos condições de fazer uma projeção real sobre a retomada regular dessas transferências e como faremos para negociar e quitar os passivos que ficarão do atual governo estadual com os municípios mineiros”, afirmou governador eleito.
Divinópolis
Acordo. A prefeitura de Divinópolis, no Centro-Oeste, entrou em acordo com os professores da cidade, que encerraram a greve. A promessa do município é quitar os salários atrasados até o fim do ano.
Petista pode ser alvo até mesmo de ações penais
As dívidas que deixará ao fim do mandato podem causar a inelegibilidade do governador Fernando Pimentel (PT). Ele pode responder ainda por improbidade administrativa e perder os direitos políticos por oito anos, como prevê a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). Porém, para alguns juristas, existe a possibilidade de o petista responder até a ações penais pelo atraso nos repasses constitucionais.
Para o advogado especialista em direito público, Diamantino Silva Filho, Pimentel pode ser enquadrado por apropriação indébita, crime previsto no Código Penal. Isso porque parte dos recursos que não foram repassados para os municípios faz parte de verbas constitucionais que pertencem às prefeituras e de cujo caminho o Estado é apenas um intermediário no caminho do dinheiro.
“O fato de exercer o cargo de governador e fazer a gestão do dinheiro não o exime de crime. Ele está se apropriando de um recurso que não é dele, que pertence a outro ente federativo. Ele nem sequer diz onde está gastando esse dinheiro que ele apropria dos municípios. Não se sabe se está indo para pagar salários ou verbas de custeio. Isso não é só um crime administrativo. No meu entender, o governador pode ser denunciado em ações penais pelo Ministério Público”, analisou.
O crime de apropriação indébita consiste no sequestro de bens alheios, sem o consentimento do proprietário. A pena varia de um a quatro anos de prisão, além de cobrança de multa.