
Imposto seletivo: um desafio ao agronegócio
O tributarista João Eduardo Diamantino, do Diamantino Advogados Associados, teve seu artigo de opinião publicado no Portal Globo Rural.
No texto, ele analisa a recém-publicada Lei Complementar 214/2025, que institui o Imposto Seletivo — apelidado de “imposto do pecado” — e os impactos diretos e desafios que essa nova tributação pode trazer ao agronegócio brasileiro.
Confira:
A recém-publicada Lei Complementar 214/2025 instituiu o Imposto Seletivo, popularmente apelidado de “imposto do pecado”. Sob uma narrativa moralizante, a nova exigência mira produtos considerados nocivos à saúde ou ao meio ambiente — embora ainda falte definir, com precisão, o que entra nesse balaio.
No macro, o debate gira em torno da taxação de cigarros, bebidas alcoólicas e veículos a combustão. Mas o impacto real pode estar onde poucos estão olhando: insumos essenciais ao agronegócio, como fertilizantes e defensivos agrícolas.
Caso sejam enquadrados como “nocivos”, esses insumos passarão a ser tributados. O resultado? A cadeia produtiva encarece, a produtividade despenca, os produtores perdem competitividade e lucratividade. Na última ponta, quem paga a conta é o consumidor.
A possibilidade de taxação de insumos agrícolas pelo Imposto Seletivo acende um sinal de alerta para o setor. Sem critérios técnicos claros, a definição do que é “nocivo” foi delegada a uma futura regulamentação, algo que, infelizmente, tem se tornado rotina em um processo legislativo cada vez mais apressado, como foi o caso da Reforma Tributária.
Por sermos um país tropical, nossa produtividade depende fortemente dos avanços tecnológicos no controle de pragas e na adubação dos solos. Segundo a Embrapa, as culturas que mais utilizam agrotóxicos são soja, milho, cana-de-açúcar e algodão, áreas em que o Brasil é referência mundial em eficiência e produtividade.
Além disso, os subsídios ao setor diminuíram significativamente. De acordo com os números da OCDE, o suporte direto ao produtor rural (PSE) caiu de US$ 13,8 bilhões em 2020 para US$ 1,96 bilhão em 2020. Em média, o indicador correspondeu a apenas 3,1% do valor bruto da receita agrícola em 2020-22, percentual bem inferior à média da OCDE, que supera 15%. Ou seja, cerca de 3% da renda dos produtores brasileiros vem de políticas públicas.
Não bastasse esse desestímulo, soma-se agora a incerteza tributária. Atualmente, os agrotóxicos são beneficiados por incentivos fiscais: o Convênio ICMS 100/1997 garante redução de 60% na base de cálculo do ICMS; o IPI é isento (Decreto 11.158/2022); e ainda há isenção de PIS e COFINS para defensivos classificados na NCM 38.08 (como inseticidas e fungicidas).
Com a implementação da reforma tributária, esses insumos seguirão classificados como essenciais e terão desconto de 60% nas alíquotas do novo IVA (IBS + CBS). Mas não se engane: a grande incógnita é o Imposto Seletivo. Embora não constem na primeira minuta de regulamentação, fertilizantes e defensivos seguem sujeitos a futuras classificações como “produtos nocivos ao meio ambiente”, o que pode colocá-los sob o alcance dessa nova tributação.
O Imposto Seletivo será progressivo: sua alíquota poderá variar conforme o grau de nocividade do produto, com base em critérios técnicos ainda indefinidos. Ou seja, um insumo agrícola considerado “altamente poluente” poderá ser alvo de alíquotas mais elevadas, mesmo que essencial à produção de alimentos em larga escala.
A ideia não é inédita, veio de fora. Parece que o Brasil gosta de copiar países que julga desenvolvidos. Na Europa, diversos países adotam essa ideia. Mas deveríamos observar a relevância desses países para o agronegócio mundial (já adianto, é ínfima).
Artigo publicado em: Imposto seletivo: um desafio ao agronegócio