STJ pode mudar entendimento sobre seguro-garantia em execuções fiscais
Por Vitor Fantaguci Benvenuti
No próximo dia 21 de novembro, a 1ª Turma do STJ retomará o julgamento do AREsp nº 2.310.912/MG, que discute a possibilidade de liquidação antecipada de seguro-garantia em processos de execuções fiscais, ocasião em que poderá formalizar a mudança da atual jurisprudência sobre o assunto.
O tema possui enorme relevância para o empresariado nacional, afetando todos os contribuintes que ofertaram ou pretendem oferecer seguro-garantia em processos executivos.
Resumidamente, a Lei de Execuções Fiscais prevê que, em garantia à execução, o contribuinte poderá ofertar seguro-garantia, viabilizando a obtenção de certidão de regularidade fiscal e a oposição de Embargos à Execução Fiscal.
Apesar disso oferecimento do seguro-garantia não tem o condão de suspender a exigibilidade do crédito tributário, pois as hipóteses de suspensão estão restritas àquelas elencadas no rol taxativo do art. 151 do Código Tributário Nacional (CTN), conforme já decidiu o STJ em 2010, sob o rito dos recursos repetitivos (Tema 378).
Ou seja, as causas suspensão da exigibilidade do crédito tributário (depósito integral em dinheiro e medida liminar, por exemplo) impedem a adoção de qualquer medida tendente à continuidade da cobrança dos débitos, inclusive a prática de atos de constrição patrimonial e prosseguimento da execução fiscal, sendo mais abrangente do que a mera garantia à execução (art. 9º da Lei de Execuções Fiscais).
Aproveitando-se desse entendimento, a PGFN passou a sustentar que, nos casos em que o contribuinte ofertou seguro-garantia e teve seus embargos julgados improcedentes em 1ª instância, seria possível a continuidade da execução, com intimação da seguradora para depositar o valor dos débitos (liquidação antecipada do seguro-garantia), antes mesmo do trânsito em julgado.
Isso porque, em regra, o Recurso de Apelação interposto em face da sentença que julga Embargos à Execução Fiscal improcedentes não possui efeito suspensivo (art. 1.012, § 1º, III, do Código de Processo Civil).
Embora os valores depositados pela seguradora não possam ser convertidos em renda da União antes do trânsito em julgado (art. 32, § 2º, da Lei de Execuções Fiscais), a Lei nº 9.703/98 autoriza que o montante depositado seja utilizado pelo Governo Federal – o que não seria possível com a simples manutenção da apólice de seguro-garantia. Portanto, a liquidação antecipada é extremamente benéfica para a União.
Segundo a lei, ao final, caso o contribuinte tenha êxito e os débitos sejam cancelados, a União deve devolver o depósito judicial, para que seja levantado pelo contribuinte vencedor.
A tese fazendária, até o momento, vem sendo reiteradamente acolhida por ambas as Turmas de Direito Público do STJ.
Contudo, no julgamento do AREsp nº 2.310.912/MG, após voto do Ministro Sérgio Kukina que acolhia a tese pró-Fisco, o Ministro Gurgel de Faria pediu vista dos autos.
Durante a sessão, o Ministro Gurgel propôs uma nova reflexão sobre o tema, manifestando seu “incômodo” em apenas “referendar a jurisprudência”.
O Ministro ponderou que o seguro-garantia é legalmente previsto e a liquidação antecipada prejudica a saúde financeira das empresas. Além disso, observou que o objetivo da União para requerer a liquidação antecipada é, de fato, possibilitar a utilização imediata dos valores depositados em juízo, com base na Lei nº 9.703/98, antes do trânsito em julgado.
Em seguida, O Ministro Sérgio Kukina, que já havia proferido voto favorável à tese defendida pelo Fisco, concordou com as ponderações do Ministro Gurgel de Faria, mencionando também a sua “intranquilidade” sobre o tema e que não vê “muita lógica” em antecipar a liquidação do seguro garantia.
Na sequência, o Ministro Paulo Sérgio Domingues afirmou que, enquanto exercia o seu cargo de Desembargador Federal do TRF-3, entendia pela impossibilidade de liquidação antecipada do seguro-garantia antes do trânsito em julgado dos Embargos à Execução Fiscal, mas suas decisões vinham sendo reformadas pelo STJ.
Com isso, a 1ª Turma do STJ sinalizou uma provável mudança de entendimento sobre o tema, que poderá ser confirmada em 21/11/2023, data em que será retomado o julgamento do AREsp nº 2.310.912/MG.
Paralelamente, no final de outubro de 2023, a Ministra Assusete Magalhães, Presidente da Comissão Gestora de Precedentes do STJ, proferiu decisão favorável à apreciação da “possibilidade de liquidação do seguro-garantia antes do trânsito em julgado dos embargos à execução fiscal” sob o rito dos recursos repetitivos.
Caso o STJ prossiga com o julgamento do tema em sede de recurso repetitivo, a tese firmada deverá ser observada, obrigatoriamente, por todos juízes e Tribunais do país.
Nesse contexto, resta aos contribuintes acompanhar a resolução do AREsp nº 2.310.912/MG, que poderá trazer uma nova perspectiva à atual jurisprudência do STJ sobre o tema, às vésperas de um provável julgamento sob o rito dos recursos repetitivos.
Vitor Fantaguci Benvenuti é advogado da área tributária no escritório Diamantino Advogados Associados.