O que o agro pode esperar do ano que se inicia: uma perspectiva ambiental

O que o agro pode esperar do ano que se inicia: uma perspectiva ambiental

Por Eduardo Diamantino e João Eduardo Zica Diamantino                                                                                      

Trabalhar com previsão é algo inerente ao agro. Da meteorologia, ao preço das commodities, esse setor da economia sempre olhou e esperou pelo futuro.

O fim do prazo de adesão ao Plano de Regularização Ambiental (PRA), mudança de presidente, um anunciado arrocho na questão ambiental, acordo das principais tradings do agronegócio na COP 27, são alguns dos muitos pontos que podem impactar o produtor rural no ano que se inicia.

Na verdade, essa nova fase terá ameaças internas e externas das mais variadas. Comecemos pelas nacionais. Nos quatro anos que se passaram é incontestável que houve um arrefecimento na fiscalização ambiental. Os dados do próprio Ibama comprovam isso. No ano passado, o Ministério do Meio Ambiente teve o seu menor orçamento em duas décadas, com uma redução de quase 28% em relação ao ano de 2020.

Nesse período foi ainda prorrogado inúmeras vezes o prazo de entrega dos dados do Cadastro Ambiental Rural (CAR) e do programa de regularização ambiental (pela Lei 12.651 de 2012). Agora, estamos nos aproximando do final do ano e de última hora ainda é incerto se haverá prorrogação. O andamento do PL nº 36 de 2021 é que foi retirado de pauta pelo relator. Tudo isso há alguns dias do prazo final. E dá-lhe emoção e insegurança.

A validação desse instrumento de controle (CAR) é um caso à parte.  Nascido na Lei 13.887, não foi até o momento totalmente validado em nosso País. Dados divulgados pela PUC do Rio mostram a diferença existente entre os Estados. Os exemplos são díspares: no Paraná foram apresentadas 17.000 inscrições e apenas 395 foram validadas, contrastando com o Espírito Santo onde a integralidade do que foi apresentado foi aprovada.

Os problemas em sua efetiva implantação são inúmeros: em diversos Estados existe diferença entre os dados do PRE (que são estaduais) e os dados do CAR (que por serem federais foram gerados pelo Inpe). Pelo que consta há um problema de base de dados. Outro ponto é que o CAR que é feito por autolançamento pode ser preenchido via net de forma precária e errada. Feito dessa maneira gera colidência entre áreas. Mais um ponto para a confusa questão do domínio de terras brasileiro, um tema importante que não foi enfrentado pelo governo que agora se encerra. Uma confusão incrível para o produtor.

Com a eleição do presidente Lula a questão ambiental volta ao centro das atenções e já é tida como certa a retomada das fiscalizações e, podem esperar, os excessos de antes. Parece que todo o desaparelhamento dos órgãos de controle será revisto. A oscilação irá de um limite a outro.

A equipe de transição propôs medidas que pretendem evitar a ocorrência de prescrição nas multas ambientais, algo complicado e com viés de revanchismo. Mas não é só, do ponto de vista jurídico é algo inconstitucional. Isso porque prescrição é a extinção da pretensão à prestação. Ela está mencionada nos artigos 205 e 206 do Código Civil e deve ser tratada como norma fundamental para a estabilização das relações sociais. Sua função é gerar segurança jurídica para a sociedade. Passado determinado período aquela obrigação deixa de existir. Alterar regra prescricional é instaurar regime de exceção e só vai gerar insegurança jurídica.

O que se pretende no momento é alterar a regra da extinção da obrigação por uma inoperância do poder público. Ou seja, já que os órgãos de fiscalização provaram ser ineficientes devemos penalizar os cidadãos e deixar sobre eles a coercibilidade eterna. Algo tão descabido quanto ilegal.

Essa tentativa de alterar categorias de extinção do direito já foi feita 25 anos atrás, em 1997, durante o governo FHC. Naquela época, mediante uma pretensa sobrevalorização de indenizações editou-se a MP 1.577/6 e a MP 1.632/11 para prever uma ampliação no prazo de propositura de ações rescisórias pelo poder público.  A questão foi levada ao Supremo Tribunal Federal na ADI 1.753-2/DF que rapidamente concedeu, à unanimidade, medida cautelar para suspender sua eficácia. Os fundamentos no julgamento da medida cautelar foram que o veículo utilizado (MP) não continha os requisitos da urgência e relevância e feria a igualdade entre as partes, criando para o poder público um privilégio inconstitucional. Será que esse episódio foi esquecido e será repetido?

Do exterior, a ameaça ganhou forma na COP27, realizada recentemente no Egito. A conferência é organizada com a finalidade de proteger o meio ambiente mundial. As decisões de lá merecem ser sopesadas antes de aplicadas por aqui. Interessa-nos aqui o acordo dos principais players do mercado Agro, que resolveram aderir à questão ambiental de maneira ampla, mas às custas dos produtores rurais.

Há algumas COPs a discussão sobre a aquisição de produção agrícola de área de desmatamento ilegal ocorre. Obviamente, trata-se de um valor a ser perseguido e que deve ser combatido. A questão reside em determinar o que é legal e ilegal.

Ao considerar que a data base para o fim do desmatamento já ocorreu e nada mais pode ser desmatado para a produção agrícola, como querem, teremos grandes consequências por aqui. Por esse documento se pretende “congelar” a fronteira agrícola nos biomas amazônico e cerrado aos níveis atuais. Esse acordo esquece que no Brasil, respeitados os limites legais, ainda há áreas que podem ser convertidas em agricultáveis. Da forma proposta pretende “anular” a possibilidade de expansão da fronteira agrícola brasileira. Atualmente estimada em 70 milhões de hectares. Em áreas que respeitam a legislação ambiental atual, como o Código Florestal e outras.

Pode-se argumentar que apenas os grandes traders não compraram produtos das novas áreas. Mas para quem o produtor rural vai vendê-los? Ficaram as novas áreas com a pecha de ambientalmente inadequadas e relegadas a um sub mercado? A questão pode ainda se complicar se as medidas forem adotadas pelos países adquirentes dos produtos, especialmente a União Europeia.

Incrível pensar que um País onde cidadãos passam fome e que tem o Agronegócio como seu grande motor, se possa assistir a uma obrigação dessa ser estabelecida e nada fazer.

A vontade dos grandes players de mercado ultrapassa os limites estabelecidos em lei, delimita as terras agrícolas do Brasil e cria um ônus à produção rural. A conta será suportada apenas pelo lado de cá. Sem exploração de áreas com potencial produtivo não haverá comida, geração de empregos, riqueza e tributos.

Merece censura ainda a posição do governo eleito, que tende a concordar com isso. Parece que estão mais preocupados em transmitir uma boa imagem aos estrangeiros como protetores do meio ambiente do que defender a produção agrícola brasileira. Sem falar que a erradicação da pobreza poderia ser feita em parte com a produção dessas áreas.

Para o próximo ano talvez o clima e o preço futuro das commodities seja algo mais previsível do que as questões ambientais que deverão ser enfrentadas pelo setor.

Eduardo Diamantino é sócio do Diamantino Advogados Associados, é vice-presidente da Academia Brasileira de Direito Tributário e João Eduardo Zica Diamantino é estagiário no Diamantino Advogados Associados.

 

https://www.conjur.com.br/2022-dez-11/agro-esperar-ano-inicia-perspectiva-ambiental

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