Lei de Falências foi oportuna, mas ainda não suficiente para conter crise econômica

Lei de Falências foi oportuna, mas ainda não suficiente para conter crise econômica

Por Severino Goes

Seis meses depois de sua entrada em vigor, a nova Lei de Falências (14.112/20) divide opiniões entre especialistas consultados pela Conjur. Embora o prazo seja curto para a medição de resultados, ressaltam que a mudança legislativa foi oportuna, principalmente por causa da crise econômica resultante da pandemia do novo coronavírus.

Mas, por outro lado, apontam para o fato de que as mudanças não têm sido suficientes para conter a crise. “Nem mesmo as inovações conciliadoras e mediadoras se mostraram até o momento eficazes, necessitando ampliar sua aplicação para que essas formas de composição representem um avanço a curto prazo”, diz a advogada Lívia Bíscaro Carvalho, coordenadora da área cível no Diamantino Advogados Associados.

Dados da Serasa Experian registram queda no número de pedidos de falência e também de recuperação judicial nos primeiros seis meses deste ano, em comparação com o mesmo período de 2020. De janeiro a junho do ano passado, foram registrados 1.669 pedidos de falência diante de 1.522 pedidos no mesmo período de 2021. Já os pedidos de recuperação judicial chegaram a 1.975 de janeiro a junho de 2020 e a 1.509 no mesmo período de 2021.

De acordo com o advogado Marcos Velloza, do Velloza Advogados, o cenário se explica principalmente em razão da crise provocada pela pandemia sobre os agentes econômicos, que acabaram obrigados, em muitos casos, a renegociar dívidas e contratos extrajudicialmente, para evitar, nesse cenário de recessão, uma enxurrada de pedidos de recuperação judicial e de falência fadados ao insucesso, desfavoráveis aos interesses de credores e devedores.

Outro fator que pode explicar a redução dos pedidos de recuperação judicial, diz ele, é a introdução, pela nova lei, de dispositivo que permite ao juiz, quando reputar necessário, nomear profissional de sua confiança para promover a constatação das reais condições de funcionamento da requerente e da regularidade e da completude da documentação apresentada com a petição inicial.

“Tal medida certamente pode inibir o ajuizamento de pedidos de recuperação judicial por empresas inativas, já em estado falimentar, que se utilizavam do processo de maneira protelatória, geralmente para blindar parte do patrimônio em detrimento de seus credores, até a inevitável, e muitas vezes  tardia, convolação da recuperação judicial em falência”, afirma Velloza.

As falências decretadas de janeiro a maio de 2020 ficaram em 1.091. Já no mesmo período de 2021, foram 1.016 falências decretadas.  Nos primeiros seis meses de 2021, o setor de serviços puxou o ranking dos pedidos de recuperação judicial com 238 ocorrências, seguido do comércio, com 96, e da indústria, com 73 pedidos.

“Nos seis meses de vigência da nova lei, muitos dos seus institutos já foram incorporados ao dia a dia do Judiciário, além de alguns que já vinham sendo utilizados com base na jurisprudência e foram apenas positivados com a nova lei”, diz Paola Ladeira Bernardes, sócia do Chenut Oliveira Santiago Advogados e responsável pelo Departamento de Contencioso.

É o caso, segundo ela, do chamado stay period, período em que as ações de execução contra o devedor ficam suspensas. Embora na redação original da Lei 11.101, de 2005 (Lei de Recuperação Judicial), o prazo de 180 dias fosse improrrogável, na prática o Poder Judiciário já vinha admitindo a sua prorrogação, desde que justificada. O mesmo ocorre com a recuperação judicial de grupos econômicos, que já era uma realidade no dia a dia do Judiciário e foram expressamente contempladas no texto da nova lei.

Embora o instituto da recuperação extrajudicial estivesse previsto já na redação original da  (Lei 1.101/05), ou seja, há 16 anos, nota-se o crescimento da sua utilização no corrente ano. Segundo levantamento realizado pelo Instituto Index, 37,5% das empresas consultadas pretendem recorrer a essa ferramenta, enquanto em 2020 o percentual era de apenas 6,4%.

Marcos Roberto Manoel, advogado especialista em Direito Empresarial, sócio coordenador do Núcleo de Direito Societário do Nelson Wilians Advogados, chama a atenção para o fato de que as novas regras relativas ao pagamento dos débitos tributários das empresas devedoras são muito mais favoráveis às contribuintes devedoras, bem como a exigência de que os planos de recuperação contemplem o equacionamento dos débitos tributários.

Isto, segundo ele, proporciona mais segurança jurídica para devedores e credores, e inclusive o Fisco, apesar de sua não sujeição aos efeitos da recuperação judicial. “A nova lei precisa de mais tempo de maturação jurisprudencial para que os seus reais efeitos sobre o sistema de insolvência brasileiro sejam percebidos e avaliados”, afirma.

Após seis meses da reforma, os novos dispositivos da lei já estão sendo incorporados e aplicados na prática pelos operadores do direito dos processos de recuperação judicial e falência, na opinião de Adriana Conrado Zamponi, sócia de Wald, Antunes, Vita e Blattner Advogados.

Os novos dispositivos, afirma, concedem benefícios relevantes para o incentivo à recuperação econômico-financeira da empresa em dificuldade, razão pela qual já se verifica que boa parte das empresas em recuperação estão recorrendo às negociações e parcelamentos especiais dos créditos inscritos em dívida ativa com a União.

Já há exemplos também de requerimento de autorização para celebração de contratos de financiamento, colocando como preferenciais os pagamentos dos créditos extraconcursais advindos dessas operações. Além disso, com a reforma da lei, houve a regulamentação de temas importantes que, na prática, já eram tratados pelos Tribunais, como a consolidação processual e substancial.

Nesse ponto, a regulamentação estabeleceu requisitos para a consolidação, de modo que os grupos econômicos tiveram que adequar os requerimentos, com a comprovação de atendimento às exigências da lei.

Severino Goes é correspondente da revista Consultor Jurídico em Brasília.

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