Reforma tributária: precisamos escolher a menos ruim
Legislação pode gerar o aumento desproporcional de tributos em setores como o de serviços e agronegócio.
O governo anunciou que o projeto tem ainda mais duas partes que deverão ser enviadas no futuro/
O Brasil é um país que caminha em círculo. A história aqui sempre se repete. Quando se trata de reforma tributária a novela parece que nunca acaba. A questão é cíclica e, de tempos em tempos, a legislação aparece como possibilidade de solução dos problemas.
Em alguns casos não dá em nada. Não passa de discurso político. Na maioria das vezes, discute-se o aumento de carga tributária. A novidade nem sempre é positiva.
No atual governo o tema foi bandeira de campanha eleitoral. Há muito se anuncia o projeto de reforma tributária do Executivo que até recentemente ninguém conhecia. Apenas se sabia que seria moderno, eficaz e revolucionário. Como sua gestação foi extremamente demorada, a Câmara dos Deputados e o Senado colocaram seus projetos de PEC em tramitação. Tais textos tem vários problemas e desprezam as peculiaridades setoriais e regionais do Brasil.
Quando todos já haviam desistido de esperar, eis que surge o texto do Governo federal. Na verdade, um pedaço do texto. O Governo anunciou que o projeto tem ainda mais duas partes que deverão ser enviadas no futuro. Sem problemas. Já esperamos 18 meses, enfrentamos uma pandemia e seguiremos aguardando.
Do texto que chegou é possível dizer que se trata de uma proposta tímida e simples. Esses são dois adjetivos que aplicados às leis não representam virtudes.
A timidez está caracterizada pela fusão de tributos pretendida. Enquanto na PEC 45 se pretende aglutinar cinco tributos, na PEC 110 são nove e na do Executivo apenas dois. Esqueçam a ideia de resolver a guerra fiscal estadual, a questão dos créditos de ISS e ICMS ou outras questões polêmicas.
Nesse projeto de lei só se pretende aumentar a alíquota do PIS e da Cofins. E mais: aglutinar as alíquotas sobre o nome CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços) e elevar sua alíquota (no caso de não cumulativa) de 9,25% para 12%.
A sua simplicidade, revelada pela fixação de poucas alíquotas em apenas dois regimes (monofásico e não cumulativo), pode gerar o aumento desproporcional de tributos em alguns setores como, por exemplo, os serviços e o agronegócio. Esses dois setores estão em começo de ciclo de produção. São extremamente sensíveis a modificações nas alíquotas por não terem créditos a serem tomados.
Por isso, no caso dos serviços a maioria das empresas se vale da alíquota do regime cumulativo pois não tem créditos a serem apropriados. O aumento de alíquota nesse caso é absurdo.
No caso do agronegócio, houve uma certa sensibilidade e se manteve a isenção do começo do ciclo para produtos in natura. Manteve-se o crédito presumido para a agroindústria adquirente. O problema é que o que foi mantido ficou limitado a 15%. Atualmente, ele é de 60% para carnes, 50% para leite e em torno de 30% para sucos. Mais um aumento disfarçado de impostos.
É possível observar ainda que, diferentemente das propostas do Congresso, essa medida não é projeto de emenda à constituição. Trata-se de simples projeto de lei ordinária. Seu trâmite é muito mais rápido e fácil de ser aprovado. A reforma tributária tem tudo para ser aprovada na frente dos outros projetos. Vai aumentar a arrecadação e pode inviabilizar diversos setores da economia.
Resta agora ao contribuinte acompanhar de perto essas alterações do sistema tributário. Dificilmente haverá alterações a favor do cidadão. Melhor seria seguir a lição do saudoso Ataliba: “tributo bom é tributo velho”. Do jeito que as coisas caminham, provavelmente a igualdade será desrespeitada em nome da simplicidade e haverá uma enxurrada de ações no Judiciário. Como dito no início, já vimos isso antes.
*Eduardo Diamantino é vice-presidente da Academia Brasileira de Direito Tributário (ABDT) e sócio da Diamantino Advogados Associados.