A tributação sobre as plataformas digitais no Brasil

A tributação sobre as plataformas digitais no Brasil

A economia, de um tempo para cá, vem percebendo a necessidade de se adaptar a todas as inovações tecnológicas que estavam e continuam surgindo, dando espaço para as chamadas plataformas digitais, uma espécie dentro do gênero da economia compartilhada, que presta serviços à terceiro de uma forma menos burocrática. Isso com algumas vantagens inovadoras, tais como serviço do Airbnb — que possibilita de forma mais cômoda alugar desde um quarto até uma mansão.

Acontece que enquanto por um lado a economia vem se adaptando às necessidades das pessoas, a tributação que recai sobre ela continuou seguindo o mesmo modelo, com suas características arcaicas, dando espaço a uma enorme discussão sobre qual tributo deve ser aplicado para este tipo de serviço e onde tributar, no local onde ele foi prestado ou onde o seu software/aplicativo está? A falta de um domicílio fixo para tributação faz com que muitas vezes nenhum tributo seja arrecadado.

O ponto a ser analisado é o modelo de tributação o qual o Brasil adota desde 1966, sendo um dos únicos países a criar um tributo para cada tipo de atividade. Com alíquotas altíssimas inseridas em cada uma das modalidades, municipais, estaduais e federais de tributação, interfere diretamente no valor do produto a ser adquirido, incentivando a sonegação, pois não é percebida a aplicação por nenhum desses entes ao cotidiano brasileiro e, em muitas situações, estagnando a economia.

O maior exemplo do caso exposto é a Guerra Fiscal de Competências em que de um lado tem o  Imposto sobre Serviços (de qualquer natureza) que é arrecadado pelos municípios e, do outro lado, o Imposto sobre Mercadorias e Serviços (de transporte e de comunicação). Com toda essa discussão sobre qual o ente competente para tributar o serviço disponibilizado pelas plataformas digitais não se atentaram que o serviço existe por consequência de um software desenvolvido para a prestação de um serviço em específico, seja ele de transporte, hotelaria ou alimentação.

A questão é que no lugar da empresa tradicional que conhecemos estão as plataformas digitais, fruto dos softwares, e independente de prestação de serviço a discussão está no domicílio tributário, pois com o nascimento destas não se sabe ao certo onde é o domicílio a se tributar, às vezes, por falta de cláusula contratual, e, principalmente por falta de lei específica. Consequência: as plataformas digitais, leia-se empresas digitais, em diversos casos não estão sendo tributadas de forma alguma no Brasil.

Como dito, as plataformas digitais estão crescendo de forma exponencial e a falta de uma tributação aplicada a ela gera impactos negativos para a economia do país. Isso porque essas empresas arrecadam, entretanto, em muitos casos nenhum tributo incide sobre este fato gerador. Com isso, a receita do país diminui, ou seja, no final das contas o dinheiro começa a não ser suficiente para manter todos os gastos à serem cobertos.

No final de 2017, o Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz) publicou o Convênio 106/17 — que dispõe sobre aplicação de ICMS sobre bens e mercadorias digitais, vetando a sua incidência, como se percebe nas cláusulas 1 e 2 deste.

Logo, é perceptível que o convênio se preocupou em manifestar quanto aos bens e mercadorias digitais, descartando a aplicação do ICMS para estes, manifestando o imposto estadual sobre mercadorias e serviços não ser aplicado aos softwares responsáveis pelas plataformas digitais, mas de outro lado não dispôs sobre qual o tributo correto a ensejar sobre este fato, deixando mais uma vez o país à mercê.

Como toda mudança, essa também tem prós e contras, contudo, sendo feita uma reforma bem estruturada e baseando-se em modelos já existentes como o Imposto sobre Valor Agregado (IVA), aplicado amplamente na Europa, o Brasil tem muito a ganhar com uma alteração dessas. Como dito, o Brasil utiliza de um sistema tributário extremamente arcaico e totalmente burocrático, que não traz muitas facilidades e benefícios aos seus contribuintes. Apesar de todas as imunidades e isenções fiscais isso não passa de maquiagem perto do tanto que se paga e o pouco que se recebe – logo, mesclando os cinco impostos (ISS, ICMS, IPI, IOF e CSLL) a uma única alíquota variando conforme a necessidade do serviço e do bem a ser utilizado. É uma forma de o estado incentivar a população.

Como exemplo, em alguns países como Arábia Saudita, Rússia e Noruega, entre outros, já vem sendo cobrado o IVA sobre os hóspedes que utilizam dos serviços disponibilizados pela plataforma digital do Airbnb. O próprio site disponibiliza informações sobre a cobrança do tributo:

O Imposto Sobre Valor Agregado, ou IVA, é um imposto cobrado sobre a oferta de mercadorias e serviços.

As alíquotas do IVA são calculadas de acordo com a alíquota local do país de residência do cliente ou o país de fornecimento. O IVA é cobrado no momento do pagamento e seu cálculo é baseado no valor total da taxa do hóspede de uma reserva. Se você alterar sua reserva, o IVA será ajustado de forma a refletir qualquer mudança no valor da taxa de serviço.

O IVA é deduzido do seu pagamento e calculado de acordo com o valor da taxa de serviço do anfitrião de uma reserva (salvo isenção em contrário). Se a reserva for alterada, o IVA será ajustado de forma a refletir qualquer mudança no valor da taxa de serviço.

É claro que como esse imposto não está presente em todos os países onde o Airbnb presta serviço nem todos estão sujeitos a ele, gerando uma relação desigual entre aqueles que cadastram seus imóveis com a finalidade de alugarem desde um cômodo até a casa inteira por uma longa temporada. Isso torna ainda mais evidente a necessidade, de forma ágil, da aplicação de um imposto ao caso em concreto das plataformas.

As plataformas digitais já são uma realidade concreta. Apesar de ainda estar em crescimento, ela vem sendo inserida no mercado há bastante tempo. É preciso, agora, se adaptar a esse novo modelo de empresa, sem um domicílio tributário certo, deixar discussões de qual é o ente competente para tributar e de fato começar a arrecadar. Enquanto as discussões não são sanadas, renda está girando sem qualquer tributação. É preciso um consenso sobre a forma mais eficaz de tributação, seja para o Estado e, também, para o contribuinte, pois não tributar também

Maria Victória Ribeiro Podboy é advogada no Diamantino Advogados Associados.

Revista Consultor Jurídico, 17 de novembro de 2019, 6h02

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