Voando sem radar: o entendimento da Receita Federal do Brasil sobre os drones
Por João Pedro Bolonha e Beatriz Palhas Naranjo
A Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) passou a reconhecer o drone como aeronave remotamente pilotada (RPA).
Os drones são aeronaves que exercem diferentes funções, a depender do seu modelo e capacidade. Podem ser utilizados para aerofotogrametria, transporte, implemento agrícola ou mesmo para diversão do usuário.
Nesse mesmo sentido, a Organização Mundial das Aduanas (OMA), durante a Convenção do Sistema Harmonizado (Harmonized System Nomenclature 2022 Edition), aprovou uma nova subposição específica para as aeronaves remotamente pilotadas (RPAs), ou seja, drones.
A partir de 2022, deveria entrar em vigor a nova Nomenclatura Comum do Mercosul (NCM) específica para os drones, aprovada pela OMA. Porém, até o momento, a Receita não se manifestou sobre a nova classificação — o que mostra, mais uma vez, que eles estão voando sem radar.
Essa definição é de extrema importância, tendo em vista que os produtos industrializados, incluindo os drones, são tributados de acordo com a sua classificação na NCM, aprovados pela OMA.
Ocorre que a Receita Federal do Brasil ainda não consolidou o entendimento de que os drones devem ser equiparados às aeronaves e, como consequência, acabaram informando diferentes posições de NCMs aos contribuintes.
A divergência quanto sua classificação fica evidente diante das diversas soluções de consultas proferidas pelo órgão fiscal, que variam, principalmente, entre as posições 88.02 e 85.25.
Publicada em 2018, a primeira solução de consulta (SC Cosit n° 98.304/2018) definiu o drone por “câmera digital integrada a um helicóptero de quatro rotores teleguiado”, a fim de classificá-lo na posição NCM 8525.80.29.
No ano seguinte, a Receita alterou seu entendimento através da SC Cosit n° 98.442/2019 e definiu o drone por “helicóptero de quatro rotores teleguiado, integrado a uma câmera fotográfica digital” sendo classificado na posição NCM 8802.11.00.
Para surpresa dos contribuintes, no mesmo ano, foi publicada a SC Cosit n° 98.548/2019 definindo o drone por “brinquedo na forma de um helicóptero de quatro rotores teleguiado” e alterando, novamente, sua classificação para posição NCM 9503.00.97.
Já em 2020, a SC Cosit n° 98.249/2020 definiu o drone por “pulverizador agrícola” apenas pelo fato de que o mesmo era utilizado para dispersão de sementes ou fertilizantes sólidos, sendo, assim, classificado na posição NCM 8424.49.00.
Aliás, os diversos entendimentos e possíveis classificações trazem como consequência uma variação de até 10% quando falamos do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI). Como exemplo, sua classificação no NCM 88.02 é tributada em 10%, já sua classificação no NCM 85.25 é tributada em 20%.
Ora, a Receita claramente mostra-se perdida ao não estabelecer um critério de classificação para um equipamento que já foi reconhecido e equiparado à aeronave por diferentes órgãos.
Na verdade, classificações que não sejam a posição NCM 88.02 — outros veículos aéreos (por exemplo: helicópteros e aviões); veículos espaciais (incluindo os satélites) e seus veículos de lançamento, e veículos suborbitais — deveriam ser desconsideradas. Pois, como citado anteriormente, já existe entendimento consolidado por diversos órgãos, como Anac e OMA, que drones são aeronaves — logo, não caberia enquadrá-los em outra classificação de NCM, como tem feito a Receita em diversos casos.
A divergência de entendimento fazendário fez uma empresa recorrer ao Judiciário para suspender a aplicação de uma solução de consulta que classificou os drones no NCM 85.25.
A decisão liminar proferida nos autos do Procedimento Comum n° 5007255-78.2020.4.04.7208/SC deferiu todos os pedidos feitos pela empresa e, mesmo que a ação ainda não tenha transitado em julgado, esse entendimento deve ser considerado como um ganho para os contribuintes.
Portanto, o que se espera disso tudo é o fim das discussões tributárias envolvendo drones e, principalmente, que a Receita Federal apresente um entendimento consolidado aos contribuintes. E, ainda, que deixe de exercer um papel que não é seu ao impor classificações tendo como base o que lhe convém melhor.
João Pedro Bolonha é estagiário no Diamantino Advogados Associados.
Beatriz Palhas Naranjo é estagiária no escritório Diamantino Advogados Associados.