Carnaval tributário: a interdependência e seus impactos no ICMS

Carnaval tributário: a interdependência e seus impactos no ICMS

Por Gustavo Vaz Faviero

Na economia atual, cada vez mais é frequente a existência de grupos econômicos de empresas voltados a segregar e otimizar a sua atuação no mercado.

Nesse cenário, o número de operações envolvendo partes interdependentes (intercompany) se torna cada vez maior. A legislação tributária, buscando acompanhar essas alterações, possui previsões da forma de tributação a fim de mitigar distorções no mercado.

Por exemplo, na esfera federal, temos regras de cost sharing para despesas de IRPJ/CSLL. Já para o IPI temos um valor mínimo da operação com base no local (praça) da operação.

Contudo, analisando as legislações sobre o ICMS, em especial para substituição, observamos uma disparidade no tratamento dado pelos estados em suas operações.

Alguns majoram as alíquotas de MVA aplicáveis (São Paulo), outros dispensam a substituição tributária (Paraná), instituem nova substituição tributária intermediária (Rio Grande do Sul) ou alteram a base de cálculo da retenção do ICMS-ST (Rio de Janeiro).

Além do aumento do custo de conformidade tributária para as empresas que atuam em diversos locais, pela necessidade do conhecimento da legislação de cada lugar, surgem dúvidas sobre os limites das autonomias dos estados para regular e disciplinar regras próprias para operações envolvendo partes inter-relacionadas.

Pois bem. Primeiro temos de ter em mente que para a instituição de substituição tributária interestadual é necessária a existência de acordo específico entre os estados, como previsto no artigo 9 da Lei Kandir.

Assim, apesar de ser possível os estados regularem de forma autônoma a substituição tributária interna, caso a operação já tenha sofrido substituição tributária em etapa interestadual anterior deve o estado de destino seguir as diretrizes do convênio.

Nesse sentido, a Cláusula Segunda, §3º, do Convênio 142/2018 regulamenta assim, de forma geral, a substituição tributária:

“Cláusula segunda – A adoção do regime de substituição tributária nas operações interestaduais dependerá de acordo específico celebrado pelas unidades federadas interessadas.

(…)

  • 3º. Compete à unidade federada que instituir o regime de substituição tributária, nas operações interestaduais a ela destinadas instituir também, em relação às operações internas, aplicando-se, no que couber, o disposto neste convênio”.

De outro lado, o que o estado de destino poderia fazer seria dispensar a substituição tributária nas operações que envolvem partes interrelacionadas, nos termos da Cláusula nona do Convênio 142/2018:

“Cláusula nona  Salvo disposição em contrário, o regime de substituição tributária não se aplica:

(…)

  • 1º. Ficam as unidades federadas de destino autorizadas a não aplicar o regime de que trata o caput desta cláusula nas operações entre estabelecimentos de empresas interdependentes, exceto se o destinatário for varejista”.

O que não pode ser feito é o estado, de forma unilateral, alterar as previsões que foram entabuladas por toda a cadeia, sob pena de ofensa ao princípio da legalidade, do pacto federativo e da isonomia.

Nesse sentido já se posicionou o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul no julgamento da Apelação Civil nº 0064348-22.2020.8.21.7000:

“APELAÇÃO CÍVEL. TRIBUTÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. ICMS. OPERAÇÃO INTERESTADUAL COM RAÇÕES PARA ANIMAIS DOMÉSTICOS. SUBSTITUIÇÃO TRIBUTÁRIA PREVISTA EM ACORDO? PROTOCOLO ICMS 26/04. RESPONSABILIDADE ATRIBUÍDA AO CONTRIBUINTE INDUSTRIAL, NA QUALIDADE DE SUJEITO PASSIVO POR SUBSTITUIÇÃO, PELA RETENÇÃO E RECOLHIMENTO DO ICMS, RELATIVO ÀS OPERAÇÕES SUBSEQUENTES OU À ENTRADA DESTINADA A CONSUMO DO DESTINATÁRIO. LEI ESTADUAL QUE IMPÕE AO ESTABELECIMENTO ATACADISTA LOCAL, QUE RECEBE MERCADORIAS DE EMPRESA INTERDEPENDENTE, O REFAZIMENTO DA SUBSTITUIÇÃO TRIBUTÁRIA PARA OPERAÇÕES INTERNAS SUBSEQUENTES. IMPOSSIBILIDADE. O ESTADO, DE MODO UNILATERAL, NÃO PODE CONTRARIAR CRITÉRIOS PARA FIXAÇÃO DE BASE DE CÁLCULO, PARA FINS DE SUBSTITUIÇÃO TRIBUTÁRIA, QUANDO A OPERAÇÃO INTERESTADUAL ESTIVER REGULAMENTADA POR MEIO DE ACORDO, SEDE PRÓPRIA DA DISCIPLINA (ARTIGO 9º DA LC N.º 87/96). ALEGAÇÃO DE ANOMALIA DOS CRITÉRIOS DE BASE DE CÁLCULO PREVISTA NO PROTOCOLO 26/04. IRRELEVÂNCIA. DISTORÇÕES QUE TAMBÉM DEVEM SER REALIZADAS POR MEIO DE ACORDO. PRECEDENTE DESTA CORTE, ENVOLVENDO, INCLUSIVE, AS MESMAS PARTES”.

Ou seja, a previsão de base de cálculo distinta ou nova substituição intermediária em operação interna em razão da interdependência deve ser prevista no convênio/protocolo que regula toda a operação interestadual.

Gustavo Vaz Faviero é advogado e coordenador da área tributária e societária no escritório Diamantino Advogados Associados.

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