É ilegal limitação da Receita em despesas com transporte de funcionários

É ilegal limitação da Receita em despesas com transporte de funcionários

A Receita Federal do Brasil publicou recentemente as Soluções de Consulta Disit/SRRF nºs 7255/2021 e 6.026/2021 — que analisam a possibilidade da tomada de crédito de PIS/Cofins do transporte de funcionários.

Em sentido contrário ao disposto no artigo 172, §2º, VI, da Instrução Normativa 1911/2019, a Receita Federal autorizou a tomada do crédito do transporte dos funcionários alocados diretamente na produção de bens ou prestação de serviços.

O deferimento se deu com base no critério da imposição legal, pois a Lei 7.418/85 e o Decreto 95.247/87 estipulam que o empregador participará dos gastos de deslocamento do trabalhador com a ajuda de custo (vale transporte) equivalente à parcela que exceder a 6% de seu salário básico.

Por essa razão excluiu da base de cálculo dos créditos a parcela custeada pelo empregado (até 6% da sua remuneração).

Apesar da autorização do crédito, não podemos deixar de discordar da limitação imposta. Pois bem, o artigo 3º, II, da Lei nº 10.833/03 e o artigo 3º, II, da Lei nº 10.637/02 autorizam a tomada de créditos de PIS/Cofins bens e serviços, utilizados como insumo na prestação de serviços e na produção ou fabricação de bens ou produtos destinados à venda.

Contudo, as referidas leis não trazem um conceito do que vem a ser considerado como insumo para fins de creditamento de PIS e Cofins. Assim, formaram-se três corrente de entendimento sobre o tema. São elas:

“1) A defendida pela Receita Federal, que utiliza a definição de insumos da legislação do IPI, em especial dos Pareceres Normativos CST no 181/1974 e no 65/1979;
2) A que defendia que o conceito de insumos equivaleria aos custos e despesas necessários à obtenção da receita, em similaridade com os custos e despesas dedutíveis para o IRPJ; e
3) A que defendia um meio termo entre os posicionamentos, ou seja, que a definição de insumos não se restringia à definição dada pela legislação do IPI e nem deveria ser tão abrangente quanto a legislação do imposto de renda, devendo estar relacionada com a essencialidade ou relevância e imprescindibilidade do bem ou do serviço para a atividade da empresa”.

Após anos de discussões judiciais para decidir qual conceito deveria ser utilizado, em 2018 o Superior Tribunal de Justiça definiu o tema ao julgar o Resp nº Nº 1.221.170-PR, reconhecendo a ilegalidade da disciplina prevista nas Instruções Normativas da SRF nº 247/2002 e 404/2004. O STJ entendeu que o conceito de insumo deve ser aferido à luz dos critérios de essencialidade ou relevância, ou seja, considerando a imprescindibilidade ou a importância de determinado bem ou serviço para o desenvolvimento da atividade econômica.

Ou seja, a decisão do STJ em nada alterou o critério para aferição da base de cálculo dos créditos de PIS/Cofins de insumos, qual seja, o valor dos itens adquiridos:

“Lei nº 10.833/03
Artigo 3º 
— Do valor apurado na forma do artigo 2o a pessoa jurídica poderá descontar créditos calculados em relação a:
II 
 bens e serviços, utilizados como insumo na prestação de serviços e na produção ou fabricação de bens ou produtos destinados à venda, inclusive combustíveis e lubrificantes, exceto em relação ao pagamento de que trata o art. 2o da Lei no 10.485, de 3 de julho de 2002, devido pelo fabricante ou importador, ao concessionário, pela intermediação ou entrega dos veículos classificados nas posições 87.03 e 87.04 da TIPI;
(…)
§1º. O crédito será determinado mediante a aplicação da alíquota prevista no caput do artigo 2o desta Lei sobre o valor:
 dos itens mencionados nos incisos I e II do caput, adquiridos no mês”.

Aqui reside o erro no entendimento das soluções de consulta.

Além de confundir critérios de tributação previdenciários (teto da participação do funcionário no “vale-transporte”), a limitação do crédito apresentada pela Receita Federal altera a base de cálculo do direito creditório, ferindo o princípio da não cumulatividade.

Para fins de creditamento de PIS/Cofins, ao invés de se valer do método “imposto contra imposto” — aplicável ao IPI e ao ICMS —, o legislador ordinário adotou o método subtrativo indireto, em que se confronta “base contra base”. É o que se extrai do Item 7 da Exposição de Motivos da Medida Provisória nº 135, convertida na Lei nº 10.833/2003:

“7. Por se ter adotado, em relação à não-cumulatividade, o método indireto subtrativo, o texto estabelece as situações em que o contribuinte poderá descontar, do valor da contribuição devida, créditos apurados em relação aos bens e serviços adquiridos, custos, despesas e encargos que menciona”.

Pelo método subtrativo indireto, os créditos a serem apropriados são aqueles apurados mediante a aplicação da alíquota estabelecida em lei sobre o valor da mercadoria ou serviço. Ou seja, eventual coparticipação do funcionário em nada impacta o valor do serviço de transporte prestado. Temos uma nova tentativa da Receita Federal de limitar o direito do contribuinte.

 é advogado e coordenador da área tributária e societária no escritório Diamantino Advogados Associados.

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